"nenhuma roupa fica boa no meu corpo"
se você já falou isso alguma vez, precisamos bater um papo sério sobre produção em massa e caimento!
Conta pra mim, você já vestiu uma roupa que te serviu, mas ficou esquisita no seu corpo? Precisando de um ajuste, de repente?
Se a resposta foi sim. Essa roupa estava com um caimento ruim.
Caimento é o grande drama da roupa comprada pronta.
E trago más notícias: é quase impossível que uma roupa comprada pronta caia perfeitamente em todos os corpos.
Antes de elaborar melhor esse raciocínio, eu preciso explicar a diferença entre tamanho e caimento:
Tamanho diz respeito às medidas de uma peça de roupa.
Caimento diz respeito à relação entre roupa e corpo, ou seja, como as medidas e formas de determinada peça contorna o corpo.
Uma roupa pode servir, ou seja, estar no tamanho correto, e não cair bem.
Entender que tamanho e caimento são coisas diferentes é fundamental para que possamos pensar em soluções para essas duas questões. A maioria das pessoas não entende essa diferença e confunde alhos com bugalhos na hora de criticar a indústria da moda - que merece, sim, muitas críticas. Uma delas, com certeza é a falta de oferta de tamanhos diversos. Agora, garantir caimento perfeito vai contra o próprio conceito de indústria de massa - ou repensamos a própria indústria de massa como principal forma de consumo ou não há saída, mas isso é assunto pra outra hora.
Porque, pensa comigo, é quase impossível que duas pessoas diferentes tenham exatamente todas as medidas iguais. No entanto, para se produzir uma roupa que será vendida pronta, é preciso criar um padrão de medidas.
Antes do surgimento do prêt-à-porter, lá na década de 50 do século passado, toda roupa era feita sob medida. Se você pertencia à elite, sua roupa era feita por costureiros e estilistas renomados. Se você fazia parte da classe trabalhadora, você mesma costurava suas roupas.
Agora, se a roupa é comprada pronta, a marca que desenvolveu essa roupa não tem como saber as medidas e particularidades do corpo de cada cliente. O cliente é uma grande abstração e daí que, para produzir dessa maneira, foi preciso criar uma tabela de medidas padrão.
Importante não confundir tabela de medidas padrão com corpo padrão, porque até as marcas plus size trabalham com medidas padrão. É o padrão daquela peça para aquela marca.
Não estou tentando defender as marcas, mas, como estilista que entende de construção de roupas, eu sei que sob medida e massificado são conceitos opostos: ou uma roupa é feita para medir especificamente o seu corpo, com suas particularidades e medidas ou ela é comprada pronta e teremos que nos conformar com uma tabela de medidas padrão. As duas coisas, ao mesmo tempo, não teremos.
A ABNT até tentou melhorar essa tabela de medidas realizando uma pesquisa extensiva que durou cerca de 10 anos e mapeou corpos de homens e mulheres do norte ao sul do Brasil.
Mas para a surpresa de ninguém, a conclusão que essa pesquisa chegou foi: não existe um corpo padrão.
Foram mapeados 7 tipos físicos mais presentes na população brasileira. Diante desse dado, a gente começa a entender que a resolução do problema “caimento das roupas compradas prontas” é mais complexa do que parece.
Ah, Carol, mas é só obrigar as marcas a fazerem roupas para todos esses tipos físicos!
Bom, se isso passa a ser obrigatório, veremos o fim das marcas pequenas e autorais, porque isso forçaria as marcas a trablhar com estoques muito maiores do que elas conseguem bancar. Se hoje, uma marca pequena consegue operar com um estoque mínimo de 300 peças para uma coleção de, digamos, 30 modelos. Estaríamos aumentando esse estoque para 2.100 peças. Grande parte das marcas pequenas não tem capital para isso. Acreditem, eu presto consultoria para marcas pequenas e sei do que estou falando!
É claro que as marcas podem e devem aumentar a grade de tamanhos e oferecer roupas que não param no 42. Mas lembrem que aqui estamos falando de caimento. Tamanho e caimento são coisas diferentes!
É por isso que, dificilmente, uma roupa comprada pronta terá um caimento perfeito. Especialmente as de tecido plano, as mais estruturadas, ajustadas e com modelagens mais elaboradas.
Então, Carol, você quer dizer que não tem solução?
Não!
A minha proposta para alunas e clientes é: e se mudássemos a maneira como encaramos o processo de comprar roupa?
COMPRAR ROUPA ESTÁ MAIS PARA CONSUMIR UM BOLO DE CAIXINHA DO QUE UM BOLO PRONTO DA PADARIA!
Pense que quando você compra uma roupa pronta na loja, ela está semi-pronta e vai precisar de ajustes para ficar 100% pronta. É preciso levar isso consideração já na hora da compra.
Se você entende isso, encara como parte do processo e não como um problema do seu corpo ou algo que as marcas irão resolver um dia, grande parte da frustração diminui.
Então, em resumo:
_Variedade de tamanhos é uma coisa que a indústria pode e precisa mudar.
_Já quando o assunto é caimentos perfeitos para todos os corpos, não tem uma solução ideal. Tem respostas melhores e piores para cada contexto.
E não se engane, mesmo pessoas com corpos absolutamente padrões também precisam de um ajuste aqui e outro ali!
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Preciso encerrar esse texto, mas não sem antes dizer que esse assunto é longo e complexo e rende muitas e muitas discussões (inclusive, tem uma aula completíssima lá na comunidade Stylebreakers!). Então quero ouvir o que vocês têm a dizer sobre isso e, quem sabe, posso continuar essa pauta em uma próxima news. ;)
eu tb enfrento com as clientes, carol, a dificuldade de entender/aceitar que o trabalho de costureira boa é caro mesmo e que, muitas vezes, se não considerar esse valor, a roupa vai acabar encostada.